Iniciamos este texto com um comparativo cultural. Como planejam os americanos e como planejam os brasileiros?
Nos Estados Unidos é muito comum que o planejamento financeiro seja desenvolvido por uma vida toda, se estendendo por várias gerações, beneficiando filhos, netos, bisnetos em estruturações que podem estimar 100, 300,1 mil anos ou até mesmo funcionarem em caráter perpétuo.
Já na cultura brasileira, fomos “treinados” e “disciplinados” ao imediatismo. Isso pode ser explicado por vários planos econômicos que não deram certo, uma inflação galopante de quase 90% ao mês, confisco de contas e instabilidade política, entre muitos outros fatores.
Ficou a ideia de que o planejamento é algo distante, que o fundamental é o imediato, e que o presente é apenas agora.
Quando pensamos em nossa cultura, planejar o futuro por 100, 200 ou até 1 mil anos pode parecer quase impossível, ainda mais em um contexto no qual as sucessões familiares no Brasil acabam esbarrando, em muitos casos, em disputas judiciais.
É comum encontrarmos no sistema brasileiro disputas milionárias entre herdeiros, como a família do grupo Itaperimim, a família da artista Cecília Meireles, entre centenas de outros exemplos. Tudo isso devido à falta de planejamento pelos patriarcas que faleceram.
Nos Estados Unidos, a chamada “Dynasty Trust” é uma realidade e acaba sendo adotada por diversas famílias preocupadas com a manutenção de seu patrimônio por muitas gerações futuras.
Gigantes como Apple, Microsoft e Google não foram criadas da noite para o dia, e tiveram muitas décadas de planejamento e crescimento sustentado.
Um exemplo disso é a sucessão de muitas décadas de John D. Rockfeller. O bilionário do petróleo, que se estivesse vivo, teria sua fortuna estimada em aproximadamente US$ 318 bilhões. Isso mesmo 3 vezes maior que a de Bill Gates, um dos homens mais ricos de hoje.
Por meio de conceitos sofisticados de “Dynasty Trust” hoje mais de 150 herdeiros usufruem da fortuna criada por John D. Rockefeller. Nenhum desses herdeiros consegue vender uma árvore sem que exista um conselho opinando sobre as consequências. São centenas de “trusts” e corporações espalhadas em muitas estruturas, criadas para a proteção patrimonial de todos esses herdeiros “ad Eternum”.
Fortunas criadas no Brasil poderiam ser resguardadas e protegidas por muitas gerações também se por aqui ocorresse pensamento parecido. O desafio que se coloca é o da necessidade de estruturar um planejamento para muitos anos, protegendo efetivamente o patrimônio, principalmente nas já citadas sucessões familiares.
Para isso vamos explicar um pouco sobre o funcionamento de um Dynasty Trust:
Basicamente é a criação de uma corporação ou “holding americana” onde o principal (dentro dessa corporação) é protegido de ser vendido, ou até mesmo dilapidado, de acordo com as instruções iniciais do criador (Grantor).
Dentro dessas corporações (trusts) é comum encontrarmos ações de empresas gigantes, prédios residenciais e comerciais, terras, complexos industriais, apólices de seguro de vida, obras de arte caríssimas, frotas de carros antigos de colecionadores, onde o principal será sempre preservado. Em muitos casos, como receita de aluguéis comerciais por exemplo, os herdeiros usufruem da receita gerada, “da mesada” estipulada contratualmente, mas o ativo em si, estará protegido sempre, (pelo período estipulado na duração dessa “trust”) contra venda do imóvel, contra divórcio por parte dos herdeiros, brigas familiares, em resumo contra qualquer possibilidade de dilapidação patrimonial.
Estruturações corporativas como essas são oferecidas, em geral, por vários escritórios de advocacia nos Estados Unidos, especializados na área de Planejamento de herança e sucessão, onde são utilizadas estratégias diferenciadas por cada Estado americano. Por exemplo, na Flórida um “Dynasty Trust” pode ser desenhado por 360 anos, em Wyoming por 1 mil anos, já em South Dakota, New Hampshire, Illinois, essas estruturas são desenhadas de forma perpétua, dependendo da necessidade, tamanho patrimonial, entre outras especificidades. São utilizados um ou outro Estado, ou a combinação de vários estados para estruturas diferenciadas.
Essas estratégias de trusts acabam sendo vantajosas por não sofrerem taxação de impostos na hora da transferência de uma geração para outra, e garantir uma herança substancial para as futuras gerações. Cabe mencionar que modelos diferentes sofrem taxações diferenciadas. Não existe uma única regra. Cada caso é um caso.
Vamos pegar um exemplo simples:
Um pai de família que resolva investir em uma apólice de seguro de vida, na vida de um filho ao nascer, no valor de US$ 1 milhão dólares de benefício. Dessa forma o pai é o dono e beneficiário desse contrato e efetua os pagamentos do “prêmio” anuais por um determinado número de anos. O filho é o segurado somente. Espantados? Muito comum isso aqui nos Estados Unidos. Embora um pai nunca pense na tragédia de um filho vir a falecer de forma prematura, o conceito é maravilhoso. Vejam o porquê abaixo.
Com a implementação de um “Dynasty Trust”, essa apólice pode ser depositada dentro, e se estruturada de forma correta, poderá prover para o pagamento da faculdade desse filho, também da pós graduação e da aposentadoria dele, quando esse filho falecer o dinheiro acumulado dentro do “Trust” será transferido para a próxima geração, isento de impostos, onde agora o neto poderá usufruir também por toda sua geração, custeio, estudos e aposentadoria e mediante o falecimento desse neto transferir a estrutura para o bisneto e assim sucessivamente por quantas gerações o “Trust” estiver ativo. Em miúdos, pode-se, proteger, filhos, netos e bisnetos de forma inteligente e estruturada.
Estive recentemente com um advogado em Nova York, onde um de seus clientes, um arquiteto famoso na Califórnia, era herdeiro de uma mesada de quase US$ 50 mil dólares por mês, por que a 6 gerações atrás, um parente (agora muito distante) criou algo semelhante. Hoje essa estrutura, lembre-se que ao longo de várias gerações acumulumou mais de US$ 40 milhões, que em realidade não pertence a esse arquiteto e sim a essa pessoa jurídica, onde ele apenas é o recebedor (recipient) de uma “gorda mesada”, o que lhe permitiu ter acesso às melhores escolas e educação do mundo. Que em resumo o tornou quem é hoje. Isso é planejamento!
As vantagens da “Dynasty Trust” acabam sendo um caminho para evitar disputas sucessórias, já que os valores destinados a cada herdeiro acabam determinados pela trust e estão diretamente relacionados aos rendimentos e resultados obtidos pelos investimentos escolhidos dentro da mesma.
Fica da dica. É importante pensar mais como os americanos e planejar a sucessão de seu patrimônio de forma coerente e que proteja as muitas noites em claro adquirindo o mesmo.
“Planejamento sucessório é muito mais que uma ciência, é uma arte”.
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